Roberto estava deitado, pensando em
algo para lhe tirar o tédio. Pensou, pensou e não achou a solução, e assim foi
por horas, deitado naquela cama ele apenas pensava na angústia que seria sair
dali. Roberto estava trancado em casa fazia mais de uma semana, tinha medo do
que poderia encontrar lá fora, tanto medo, que resolveu ficar ali o resto de
seus dias. No começo os amigos ainda ligavam o chamando para sair, mas a
resposta sempre era a mesma, “não e não”, tinha algo que o prendia dentro da
casa, o lugar parecia mal assombrado de tão silencioso que era, sua casa é
enorme e agora estava entregue ao pó e a escuridão, era o que se encontrava de
notável na casa, mas Roberto não foi sempre o único da casa, não, ele tinha uma
linda e jovem esposa que o abandonou repentinamente, Roberto tentava achar a
resposta disso também, mas só conseguia pensar no seu tédio.
Foi quando um som quebrou a rotina da
casa, um som da campanhinha soava ao longe fazendo Roberto estremecer, ele não
imaginava quem poderia lhe visitar já que ele não tinha mais ninguém, mas ele
mesmo que com tudo dizendo que não, ele foi ver, se aproximou lentamente da
porta e percebeu pelas pequenas janelas empoeiradas que se tratava de
policiais, mas o que eles iriam querer comigo? Pensou ele. E por mais curioso
que estivesse ele não atendeu, ficou ali parado atrás da porta esperando que
eles fossem após a ida deles Roberto andava pela casa, percebeu que na escada
havia algumas manchas vermelhas, um pouco nos degraus e um pouco no corrimão,
de longe parecia sangue, mas ele não se lembrava de ter caído ali, mas como isso
não era mais importante ele seguiu caminhando, chegou à cozinha e havia um
jantar preparado sobre a mesa, à comida já estava velha e dominada por formigas
e baratas, um forte cheiro de podre levantava dali, realmente aquilo não estava
em condições de consumo, pelo menos não para um ser humano, ele foi até a
geladeira e pegou uma fruta.
Era a única opção que ele tinha para lhe
matar a fome, ele pegou algumas maçãs e subiu para o quarto, e após comer se
deitou e dormiu, ele estava em um pesadelo, via uma aranha viúva negra que com
o seu veneno matava o seu parceiro, ele se acordou então no meio da madrugada
suando muito e assustado, ele sentia um cheiro como se fosse de perfume, e
ainda mais, era um cheiro familiar, ele levantou a cabeça e olhou a sua volta,
e em meio aquela escuridão ele percebeu que não estava mais sozinho, ele olhou
fixamente para a parede e viu algo se movendo, era uma pessoa da mesma estatura
que ele e que andava curvada, como quem sentia dor, e assim se movendo,
lentamente se aproximava de Roberto, conseguia ouvir o barulho de ossos
estralando conforme aquele ser andava, e seu pescoço pendurava-se de um lado
para o outro como se a cabeça estivesse apenas pendurada, quando chegou perto
da cama podia-se ouvir sua respiração. Ofegante e misturada com gemidos de dor,
quando o ser se aproximou de Roberto que estava paralisado tamanho pavor, ele
escutou uma voz rouca que disse: “POR-QUE”, e ao terminar suas palavras deu um
grito que fez com que Roberto se urinasse encharcando a cama, ele já estava
chorando desesperado quando viu os primeiros feixes de luz entrarem pela
cortinha da janela, aquele tormento havia acabado e a criatura desaparecido.
Ele não sabia o que fazer, primeiro a
policia rondando sua casa e agora esta visão diabólica, estaria ele louco? Ele
poderia sair e procurar uma resposta, talvez encontrar sua amada, mas ele não
tinha forças para sair deste lugar, então resolveu fazer o que podia e procurar
ali mesmo, foi até a escada onde percebeu as machas vermelhas e subiu cada
degrau que ele subia ele sentia uma tontura, e quando se aproximava do fim dela
percebeu que havia alguém o olhando de cima, estava apenas com parte do rosto
aparecendo do corredor e antes que ele pudesse identificar quem era o mesmo
correu, ele correu atrás procurando saber quem havia invadido sua casa, ele
correndo gritava:” VOLTE AQUI LADRÃO MISERÁVEL E VAMOS VER O QUE CONSEGUE
LEVAR!”, quando chegou ao corredor viu que havia entrado em seu quarto e ele
foi atrás, abriu a porta, mas não havia ninguém ali, ele então começou a ouvir
coisas, uma voz doce que surgia do nada, ele percebeu então que se tratava da
voz de sua amada, ele estava nervoso e não sabia o que acontecia, foi ai que
ele olhando a sua volta a viu sentada na cama envolta por uma toalha molhada,
ela falava no telefone com alguém, falava que estava preocupada e que queria
resolver isto logo, que não sabia quando “ele” poderia fazer alguma besteira e
a matar, quando terminou de falar isto o silencio voltou a reinar, Roberto cai
de joelhos não acreditando no que percebia, “seria isso uma lembrança minha?”
se perguntava ele, “teria eu matado o amor de minha vida? Será que eu
enlouqueci e estraguei tudo o que construímos de uma forma trágica?”, ele não
conseguia se acalmar, só pensava no sangue em suas mãos e no que ele teria
feito, foi até a escada e quando chegou lá ouviu como se algo caísse rolando
por ela, algo pesado, que rolou e estourou lá em baixo. Ele se ajoelhou com as
mãos na cabeça e via que o que rolava era realmente um corpo, “que flashes são
esses?”, ele tremia e não sabia o que estava acontecendo.
O dia levou uma eternidade para passar,
Roberto só conseguia se lamentar pela morte de sua esposa e pela besteira que
havia cometido, a noite havia chegado e ele estava parado na janela observando
a vazia rua, tudo havia mudado tão rápido, ele estava só mais do que nunca,
seria esse o motivo da policia o estar procurando? Pelo crime que cometeu! “eu
devo me entregar então!” disse Roberto para si mesmo, ele foi até o telefone,
mas a linha estava muda, foi até a porta, mas não conseguia a abrir, pois
estava trancada, ele indignado foi até segundo andar, subiu no sótão e tentou
se jogar pela fresta que tinha de uma velha janela quebrada, mas por algum
motivo que ele desconhecia seu corpo simplesmente não passava pelo vão, era
como se a casa o puxasse para dentro novamente, ele se apavorava novamente, “o
que é isso?!”, ele desceu correndo, pois ouviu o barulho da porta sendo aberta,
da escada ele via dois policiais entrando na casa, e junto deles estava mais
alguém, uma voz feminina disse então: “Fo-foi ali senhor”, ele reconhecia a voz,
mas não acreditava, era sua amada esposa que estava ali, a felicidade tomava
conta de seu coração, pois percebia que ela não havia morrido, ele desceu as
escadas correndo quase caindo e a abraçou, porém algo inesperado acontecia,
seus braços não a tocavam e ninguém percebia sua presença, Roberto não entendia
o que estava acontecendo, a moça diz: “nossa como esta frio esta casa, parece
que estamos de novo no inverno aqui dentro”. Roberto confuso caiu em desespero,
estava imóvel no chão olhando para sua esposa, “foi aqui que ele caiu, as
manchas de sangue provam tudo, é o sangue dele podem averiguar” dizia a moça
com o olhar baixo, “então tu quis aplicar o velho golpe do baú não é moça?”
dizia o policial sorrindo, “eu o amava! Ma-mas conheci alguém que me completava
de uma maneira estranha, e conhecia Roberto, sabia que se ele soubesse que eu
não o queria mais iria enlouquecer e estragar meu novo romance”, “então a
senhora o derrubou da escada parecendo ser um acidente!”, “be-bem senhor
policial foi i-iss-o”, Roberto estava boquiaberto, como assim ele estava morto?
Sua amada não o amava mais? Mesmo depois de ele fazer tudo por ela? Foi um
golpe? Ela tinha outro amor? Ele foi enganado? As perguntas se remexiam em sua
cabeça o fazendo cair novamente, ele se descontrola e sai se debatendo pela
sala da casa, os móveis começam a se mover no ar, ele não sabia como, mas
afetava as coisas a sua volta, os policiais estavam apavorados e a moça também,
ela caiu em prantos quando percebeu o que acontecia, “eu nunca acreditei em
espíritos, mas se tu esta ai Roberto quero que saiba que nunca foi minha
intenção ti enganar, apenas queria o melhor para nós, e sabendo disso fiz o que
fiz! Mas o remorso me tomou e vim até aqui ti pedir perdão, tu foi o único que
me apoiou a vida toda e eu ti fiz isso, não sou digna de estar viva depois de
tirar alguém tão brilhante da terra, então irei até ti pedir perdão olhando em
teus olhos e entenderei se tu não ao aceitar, apenas quero ter a chance de
pedir”. Roberto parou, ficou olhando para sua amada que estava com uma
aparência insana, ela se levantou e foi na direção dos policiais que ainda
estavam agachados por causa das coisas que voavam, ela pegou a arma da cintura
de um deles, Roberto correu na sua direção gritando “NÃO!”, e antes que alguém
pudesse fazer algo ela já havia puxado o gatilho.
Anos depois do acontecimento, e a
história de Roberto e sua amada que havia lhe traído se espalhou rapidamente,
todos queriam conhecer a casa onde tudo começou e terminou, muitos tinham
duvidas de que Roberto teria ou não dado o perdão para ela, ou se ainda estaria
ali na casa confuso, chorando, e se lamentando pela traição que sofrera, e ela?
Estaria bem por ter se arrependido de coração? Ou estaria em algum lugar
sofrendo sua pena. Muitos acreditam que não, muitos acreditam que eles estão na
mesma casa, vivendo dia a cada dia seu grande amor, que a pós vida pode
eternizar, por mais que fosse de uma forma trágica, ainda assim era verdadeiro,
mas e tu, no que acredita?
Tenebrae.